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Resumo das principais reformas administrativas ocorridas no Brasil

Ao longo dos anos o Brasil tem passado por algumas reformas administrativas. No entanto, cabe destacar que a década de 1930 ficou marcada pela pioneira reforma burocrática, ocorrida no governo de Getulio Vargas.

Antes da década de 1930 o Estado brasileiro assemelhava-se a um mercado de troca de votos por cargos públicos. Era uma combinação de clientelismo e patrimonialismo, explica Paludo (2013). Além disso, Rezende (2004) afirma que até este período a Administração Pública estava muito distante de ser considerada uma burocracia profissionalizada.

Sendo assim, neste texto será discutida a reforma burocrática de 1930, bem como o período compreendido entre a administração de Kubitschek e a implementação da reforma modernizante no governo militar com o Decreto Lei 200/67, momento de crescimento da burocracia sob forte descentralização.

Em seguida, será também abordado o retorno à democracia de 1985 até o chamado retrocesso burocrático de 1988.

A reforma burocrática  da década de 1930

Na era Vargas, a partir da década de 1930, o Brasil passou a enfrentar um forte momento de industrialização e de intervenção do Estado no setor produtivo. Alguns pontos principais desta época que merecem destaque são:

  • tentativa de implantar estruturas gerenciais e de coordenação;
  • processo de racionalização;
  • surgimento das primeiras carreiras burocráticas;
  • tentativa de adoção do concurso como forma de acesso ao serviço público;
  • a reforma burocrática foi uma consequência da emergência de um capitalismo moderno;
  • mudanças na forma de gestão dos recursos humanos e orçamentários;
  • implantação de mecanismos de controle na burocracia para romper com o clientelismo e com o patrimonialismo.
Vale ressaltar que muitas das medidas adotadas na época em termos de reformas administrativas acabaram levando em consideração as feridas geradas pela crise internacional de 1929. Desta forma, diz-se que a partir de 1930 emergiu um Estado Novo, também denominado de Estado Administrativo.

A criação do DASP

Neste contexto houve a criação do DASP – Departamento Administrativo do Serviço Público, que havia sido previsto na Constituição de 1937 e foi criado pelo Decreto Lei 579/38. O DASP, além de fornecer elementos para melhoria da máquina pública, deveria fornecer assessoria técnica ao Presidente da república e elaborar a proposta orçamentária.

Conforme Paludo (2013), os principais objetivos do DASP foram:

  • centralizar e reorganizar a administração pública;
  • definir política para a gestão de pessoal;
  • racionalizar métodos, procedimentos e processos administrativos em geral;
  • combater práticas patrimonialistas de gestão, de forma geral;
  • modernizar a administração pública.
Como é típico de uma burocracia, as medidas de Vargas neste período concentraram-se nos meios, nas atividades de administração em geral e na estrutura, mas não nos fins.

Os principais pontos positivos obtidos com a criação do DASP foram:

  • difusão das ideias e práticas modernizantes sobre a administração e gestão pública, vindas principalmente dos EUA, da Inglaterra e da França;
  • forte institucionalização de programas de formação e profissionalização de servidores públicos;
  • criação de unidades administrativas descentralizadas (autarquias);
Os pontos negativos mais importantes, conforme Rezende (2004), foram:

  • natureza excessivamente centralizadora do DASP;
  • amplo escopo e natureza dos objetivos da reforma;
  • ênfase centrada nos controles burocráticos;

A reforma administrativa do Estado Novo foi o primeiro esforço sistemático de superação o patrimonialismo. Este esforço agiu no sentido da burocratização do Estado, por meio da inserção de aspectos como a centralização, a impessoalidade, a hierarquia, o sistema de mérito e a separação entre o público e o privado (Paludo, 2013).
Ainda, Paludo (2013) explica que o Coronelismo patrimonialista dava lugar ao clientelismo e ao fisiologismo:
  • clientelismo: tipo de política em que uma pessoa (patrão) dá proteção à outra (o cliente) em troca de apoio, estabelecendo uma certa submissão pessoal que independe de relações de parentesco e não possui conotação jurídica;
  • fisiologismo: busca de ganhos ou vantagens pessoais, esquecendo de ter como foco o interesse público

Neste sentido, apesar da criação do DASP e da nova política de reformas, o relacionamento entre política e administração não havia mudado.

Período de 1946 até 1964

Ao final do período Vargas, os problemas de desempenho do Estado suscitavam a necessidade de novas reformas. No entanto, conforme afirma Rezende (2004), nenhum grande programa foi implementado no período que vai desde a criação da constituição democrática de 1946 até o golpe militar de 1964. Contudo, cabe ressaltar algumas alterações ocorridas neste período.

Houve a implementação do Plano de Metas no governo de Kubitschek (1956-1961). Este plano tinha como objetivo continuar a política de industrialização e de substituição das importações. Durante o plano ocorreu uma expansão da burocracia por meio da criação de novas unidades administrativas descentralizadas.

Após este período, em 1963, um novo grupo de políticas baseado na ideia de “administração para o desenvolvimento” foi introduzido. Este grupo de políticas foi caracterizado pela expansão do Estado e pela descentralização de funções. Neste período os servidores públicos passaram a ser regidos pela CLT (Consolidação de Leis Trabalhistas), que havia sido criada na era Vargas.

Decreto Lei 200 de 1967

Após o governo Vargas, a ausência do autoritarismo acabou impactando em perdas de atribuições do DASP, enquanto práticas clientelistas acabaram por ganhar mais espaço. Quando Vargas retornou ao governo em 1952 acabou por ter mais limitações devido à Constituição de 1946.

Já após 1964, com os militares novamente no poder, o foco foi o centralismo político e a ampliação de ações intervencionistas do Estado, mediante a expansão da Administração Indireta com o Decreto Lei 200/1967. Tal decreto apontou para dois problemas chave a serem solucionados:

  1. a centralização excessiva da Administração nos órgãos de cúpula e
  2. a ausência de coordenação nas ações do governo.
Características e alterações importantes geradas pelo decreto, conforme Paludo (2013) e Rezende (2004):
  • Instituição dos princípios do planejamento, coordenação, descentralização, delegação de competência e controle;
  • Acerca da estrutura da administração pública:
    • Administração Indireta: expandiu as Empresas Públicas, Sociedades de Economia Mista, fundações públicas e autarquias (leia mais sobre Administração Indireta)
    • Administração Direta: foi reorganizada em 16 ministérios, a saber: Justiça, Fazenda, Planejamento, Educação e Cultura, Saúde, Interior, Relações Exteriores, Agricultura, Indústria e Comércio, Minas e Energia, Transportes, Trabalho e Previdência Social, Comunicação, Exército, Marinha e Aeronáutica.
  • Quanto aos procedimentos administrativos internos, estabeleceu regras para a aquisição direta de bens e serviços, ou mediante contratação;
  • Quanto aos recursos humanos, expandiu o sistema de mérito e estabeleceu diretrizes para elaboração de plano de classificação de cargos;
  • Acabou por ocasionar a proliferação descontrolada de empresas estatais e outras organizações descentralizadas;
  • Muitas empresas e organizações foram criadas, mas não eram submetidas a controle em termos de desempenho;
  • Resultado: complexidade do sistema, alta fragmentação e problemas de controle.
Com a crise do regime militar e crise econômica mundial na década de 1970, a reforma do DL 200/1967, tal como ocorreu com o DASP, não chegou a ser consolidada, ou seja, não foi implementada completamente.
O Decreto Lei 200/1967 constitui um marco na busca de superar a rigidez da burocracia. Além disso, pode ser considerado como um primeiro contato da Administração Pública brasileira com o gerencialismo (PDRAE).

Programa Nacional de Desburocratização (PrND)

No final da década de 1970 ocorreu a criação do Ministério Extraordinário de Desburocratização. Esta foi a primeira tentativa oficial de direcionar as atividades da Administração Pública para o atendimento das demandas dos cidadãos.

Entre as atuações do programa estavam:

  • simplificação de procedimentos;
  • eliminação de informações desnecessárias;
  • desestatização, por meio de privatizações;
    • ideia de transferir para a iniciativa privada as atividades e serviços não essenciais;
  • governo atuando por meio de fomento e apoio, mantendo as atividades de controle.
O principal objetivo do PrND era frear o excessivo crescimento da Administração Indireta, de forma mais específica e de acordo com o PDRAE, os objetivos do PrND eram:

  • revitalização e agilização das organizações do Estado, 
  • descentralização da autoridade,
  • melhoria e simplificação dos processos administrativos e 
  • promoção da eficiência.

Retrocesso de 1988

A caminhada rumo a uma administração gerencial foram paralisadas na transição democrática de 1985. O PDRAE explica que neste momento, apesar da vitória democrática, houve um retrocesso burocrático, no sentido de ter ocorrido uma volta a um certo patrimonialismo.

Um dos principais resultados deste período foi a ocupação de diversos cargos públicos da administração indireta para os políticos dos partidos vitoriosos.

O PDRAE (Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado) afirma que a Constituição de 1988 acabou por levar a um retrocesso burocrático sem precedentes, provocando um engessamento do aparelho do Estado ao estender para os serviços do Estado e para as próprias empresas estatais praticamente as mesmas regras burocráticas rígidas adotadas no núcleo estratégico do Estado.

Conforme o PDRAE:

Afinal, geraram-se dois resultados:

  • de um lado, o abandono do caminho rumo a uma administração pública gerencial e a reafirmação dos ideais da administração pública burocrática clássica;
  • de outro lado, dada a ingerência patrimonialista no processo, a instituição de uma série de privilégios, que não se coadunam com a própria administração pública burocrática.

Como exemplos temos a:

  • estabilidade rígida para todos os servidores civis, diretamente relacionada à generalização do regime estatutário na administração direta e nas fundações e autarquias,
  • a aposentadoria com proventos integrais sem correlação com o tempo de serviço ou com a contribuição do servidor (PDRAE, p. 21).

Os mecanismos de controle da CF/88 favorecem o controle social, mas o modelo burocrático expresso na CF/88 dificulta a transparência administrativa (Paludo, 2013).

Considerações finais

Este texto abordou os principais pontos das reformas administrativas ocorridas no Brasil. Esta revisão histórica tratou o período da década de 1930, passou pelo PrNDE, até abordar o chamado retrocesso burocrático que emergiu com o retorno à democracia e com a promulgação da Constituição Federal de 1988.

Tal retrocesso refere-se às reformas administrativas, tendo sido fruto principalmente pela estabilidade dos servidores públicos e também pela aposentadoria com proventos integrais sem correlação com o tempo de serviço. No entanto, um dos benefícios da CF/88 para a Administração Pública foi a necessidade de concurso público para ingressar no serviço público.

Referências

Paludo, A. (2013). Administração Pública (3rd ed., p. 608). Rio de Janeiro: Elsevier.

Rezende, F. da C. (2004). Por que falham as reformas administrativas? (p. 132). Rio de Janeiro: FGV.

PDRAE (1995). Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado. Brasília. Disponível em: http://www.bresserpereira.org.br/Documents/MARE/PlanoDiretor/planodiretor.pdf