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O que é o excesso de confiança e o viés do otimismo?

Algumas vezes confundidos, o excesso de confiança e o viés do otimismo possuem algumas similaridades, mas não são a mesma coisa. Descubra como estes dois vieses de comportamento afetam o processo de tomada de decisão.

O que é o excesso de confiança (overconfidence)?

O excesso de confiança (overconfidence) é um viés que leva as pessoas a sobreavaliarem suas próprias habilidades, o que provoca um comportamento de maior propensão ao risco do que o convencional para aquele indivíduo.

O excesso de confiança pode resultar em muitos resultados negativos. Pesquisas na área da saúde têm mostrado que as pessoas são otimistas demais, e muito confiantes sobre sua própria saúde. Os resultados do excesso de confiança mostram que, em geral, é baixa a probabilidade de que as pessoas tomem medidas que venham a minimizar os riscos à saúde, tais como usar o cinto de segurança (Levine, 2014).

Um exemplo didático do excesso de confiança trata justamente da obrigatoriedade do uso do cinto de segurança. Os municípios que passam a ter em vigor alguma legislação que proíbe andar de carro sem cinto tendem a apresentar maior número de acidentes.

Apesar destes acidentes serem de menor gravidade, e o índice de mortos por acidentes no trânsito de fato reduzir, a explicação para o aumento no número de acidentes está no excesso de confiança: com o sentimento de segurança proporcionado pelo uso do cinto de segurança, os motoristas tendem a ser menos prudentes acerca das suas próprias habilidades no trânsito, dirigindo em alta velocidade, fazendo ultrapassagens perigosas, entre outros. Essa maior propensão ao risco ocasiona mais acidentes, porém, devido à maior segurança do cinto de segurança, menos pessoas morrem.

Excesso de confiança e o viés do otimismo

Menkhoff et al. (2013) afirmam que na literatura de finanças o excesso de confiança tem sido tratado com pelo menos três abordagens diferentes:

A primeira refere-se a uma subestimação da variância de variáveis aleatórias (má-calibração).

A segunda diz respeito a uma positiva e irreal auto-avaliação.

A terceira abordagem está relacionada com uma ilusão de controle. Todos estes aspectos conduzem a uma sistemática superestimação da precisão do próprio conhecimento e da probabilidade de sucessos pessoais.

Veja o que já dizia Maquiavel:

Será preciso, contudo, ser cauteloso com aquilo que fizer, e no que acreditar; é necessário que não tenha medo da própria sombra, e que aja com equilíbrio, prudência e humanidade, de modo que o excesso de confiança não o torne incauto, e a desconfiança excessiva não o faça intolerante (Nicolau Maquiavel, em “O Príncipe”).

Maquiavel já dizia que aquele que se deixa levar pelo excesso de confiança se torna incauto, sem cautela. Ele falava do mesmo tipo de comportamento que posteriormente foi chamado de propensão ao risco.

Como fica o excesso de confiança no mercado financeiro?

Pense naquele seu conhecido que começou a operar com ações e obteve a famosa “sorte de principiante” no mercado (diz a lenda de mercado que todo trader iniciante tem essa “sorte”…rsrs). A tendência é que o excesso de confiança o faça investir ainda mais em estratégias não tão bem planejadas.

Se esse investidor tiver sorte em suas duas ou três primeiras operações, provavelmente já começará a fazer projeções anuais de quanto irá ganhar e até depois de quantos anos poderá abandonar seu emprego e viver de bolsa.

No mercado financeiro, o excesso de confiança pode conduzir a um aumento do número de transações individuais e refletir em altas excessivas dos preços, bem como em bolhas especulativas em situações extremas.

Assim como o excesso de confiança provoca acidentes no trânsito; no mercado financeiro ele leva os investidores a perderem dinheiro!

Sobre isso, Prates et al. (2014) mostraram que os retornos passados de ações no mercado brasileiro geram maiores volumes de negociações nos dias posteriores, possivelmente devido ao viés do excesso de confiança. Statman et al. (2006) verificou a ocorrência do mesmo efeito para o mercado americano.

O que é o viés do otimismo?

Os termos excesso de confiança e otimismo são próximos e algumas vezes utilizados conjuntamente e sem distinção. No entanto, existem autores que fazem algumas diferenciações.

Malmendier e Tate (2005) afirmam que o excesso de confiança está relacionado com a superestimação das próprias habilidades, como QI ou habilidades de gestão. Já o excesso de otimismo está relacionado com a superestimação pessoal acerca de resultados exógenos, que não podem ser controlados por um indivíduo, como o crescimento econômico de um país ou as oscilações no mercado de capitais, por exemplo.

O otimismo exagerado reflete em um comportamento superconfiante, e uma das suas consequências é a pausa na realização de esforços antes que o objetivo previamente definido seja alcançado (Metcalfe, 1998).

Conclusão

O excesso de confiança e o otimismo são dois vieses de comportamento trabalhados na literatura de finanças comportamentais. Vimos aqui que o excesso de confiança trata-se de uma superestimação das próprias habilidades; já o otimismo diferencia-se por tratar-se de uma superestimação das expectativas que permeiam situações exógenas, fora de controle. Ambos comportamentos refletem em um comportamento de maior propensão ao risco.

Referências

Levine, T. R. (2014). Encyclopedia of Deception. South Korea: Korea University.

Malmendier, U., & Tate, G. (2005). CEO overconfidence and corporate investment. Journal of Finance, 60(6), 2661–2700.

Menkhoff, L., Schmeling, M., & Schmidt, U. (2013). Overconfidence, experience, and professionalism: An experimental study. Journal of Economic Behavior and Organization, 86(1), 92–101.

Metcalfe, J. (1998). Cognitive optimism: self-deception or memory-based processing heuristics? Personality and Social Psychology Review, 2(2), 100–110.

Prates, W. R., Santos, A. A. P., & da Costa Jr, N. C. A. (2014). Excesso de confiança, turnover e retorno: evidência no mercado brasileiro. Brazilian Review of Finance, 12(3), 351–383.

Statman, M., Thorley, S., & Vorkink, K. (2006). Investor overconfidence and trading volume. Review of Financial Studies, 19(4), 1531–1565.